Na primeira metade na década de 90, a maior
ambição de um Headbanger brasileiro
era ir a São Paulo viver todas as emoções que o festival “Phillips Monsters of Rock”
poderia lhe proporcionar, afinal, o “Monsters of Rock” era, na época o
maior festival de Rock Pesado do mundo há mais de uma década, lá fora, é claro.
Acontecendo periodicamente desde 1980 na
Inglaterra, o mega festival aconteceu esporadicamente também em outros países,
mas todos bem longe daqui e quando foi anunciado que teríamos uma edição
patrocinada pela Phillips em 1994 com KISS, BLACK SABBATH e SLAYER, todo mundo
caiu de joelhos, principalmente quando essa edição realmente foi concretizada
trazendo ainda o SUICIDAL TENDENCIES e mais quatro bandas brasileiras, a já
veterana à época VIPER e mais três novatas na cena, o ANGRA (do ex-vocalista do
VIPER), o DR. SIN (que trazia dois ex-integrantes do TAFFO e o ex-guitarrista
da CHAVE DO SOL) e os realmente novatos RAIMUNDOS, foi uma puta celebração do
som pesado televisionados por algumas emissoras de TV abertas e fechadas com
várias matérias e entrevistas em programas de TV, rádio e inúmeros jornais e
revistas noticiaram e cobriram tal evento.
No ano seguinte anunciaram uma nova edição,
agora encabeçada por OZZY e ALICE COOPER, trazendo ainda MEGADETH, FAITH NO
MORE, THERAPY, PARADISE LOST, CLAWFINGER, os argentinos do RATA BLANCA e os
brasileiros do VIRNA LISI. Mais uma vez grande frenesi foi montado em volta do
evento por parte da mídia especializada e não-especializada também, ótimo,
finalmente o Brasil tinha o seu “Monsters of Rock” e agora era só
esperar pelas novidades de peso de 96.
Da minha parte, adolescente cabeludo,
fanático pelo Hard’n’Heavy vigente
sofri muito por perder minha banda predileta em 94, o KISS, sofri demais em 95
por perder ‘a tia’ ALICE e o OZZY afinal eu não tinha grana nem autonomia pra
ir, mas em 1996 comecei o ano arrumando um emprego logo em janeiro como office-boy e a minha meta daquele ano
era estar presente na nova edição do “Monsters”, fosse quem fosse e eis
que lá pelos primeiros meses do ano a nossa Rock
Brigade já noticiava que a terceira edição traria grandes nomes como
MOTÖRHEAD, espanhola HEROES DEL SILENCIO e uma banda nova à época, o BIOHAZARD,
em seguida outros nomes foram aparecendo, entre eles os que realmente viriam,
SKID ROW, RAIMUNDOS (de novo?) e finalmente no Brasil pela primeira vez
MERCYFUL FATE, pois é, fazia pouco tempo que King Diamond tinha voltado com a
banda reformulada e lançado o disco “Time” em 94 e estava lançando naquele ano
o grande “Into the Unknown”, mas o que ninguém esperava era ver dois shows com
King nesse festival e foi o que rolou, dobradinha inédita no mundo todo e
única, ele traria sua banda solo também pra tocar em seguida, ou seja MERCYFUL
FATE abrindo e KING DIAMOND em seguida com pouco mais de tempo de palco e
promovendo o disco “The Graveyard” que também saiu naquele 1996.
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Anos 90 - os 4 primeiros capítulos dessa história. |
Pra completar o time só faltava um headliner de peso e esse nome não
poderia ser maior, IRON MAIDEN, pois é, vindo finalmente apresentar seu novo
vocalista Blaze Bayley, além da banda alemã HELLOWEEN como openning-act.
E como eu faria pra ir nessa festa? Eu era só
um adolescente cabeludo que contrariava seus pais com aquele som maligno, suas
roupas pretas e eles não podiam fazer muito, afinal eu já trabalhava e não
pegava grana com eles pra bancar meus caprichos, mas jamais minha mãe aceitaria
eu sozinho num mega-festival na capital paulista por mais de 24 horas, pois
então, arrumei dois camaradas da escola e forjamos uma história de que iríamos
de excursão pra ela ficar menos preocupada, uma baita mentira, porque o role
começou na sexta à noite, fomos de busão mesmo pra Sampa e lá a gente se virou
pra chegar ao Pacaembu, era nosso sonho mais extremo de adolescência se
tornando realidade, mal sabíamos que aquele sonho se tornaria um hábito que
levaríamos pra vida toda, felizmente, hehehehe....
Era sábado, dia 24 de Agosto de 1996, umas 8
da manhã quando chegamos à famosa Praça Charles Miller, e aquilo já tava
forrado por uma legião de roupas pretas e cabelos cumpridos, pronto, estávamos
finalmente no nosso habitat natural, depois de anos amargando olhares tortos e
preconceitos na nossa pequena cidade do interior paulista, aquilo era o HELL,
porque paraíso pra nós não era uma opção.
Logo meus camaradas já foram se preocupando
em como ‘moquiar o bagulho’ que
traziam consigo, não era o meu caso, eu nunca fui de ‘malocar bagana’ de ninguém, nem de usar, minha droga sempre foi o
Metal (parafraseando o METALMORPHOSE) então, só queria entrar logo naquele
estádio gigante de futebol pra ver um espetáculo maior que começaria lá pelas
11hs da manhã com a abertura dos portões (ficamos sem os ingressos que os
despreparados seguranças confiscaram na entrada, nem canhoto nos devolveram...)
e 13hs com o primeiro show, mas à essas horas já estávamos lá nas arquibancadas
do estádio, sim, arquibancadas, éramos meio duros de grana né, compramos os
ingressos mais baratos só pra estar lá e estávamos, vendo a estranha banda de
abertura, a espanhola HEROES DEL SILENCIO com seu vocalista à lá Jim Morrison e
um som que, definitivamente, não agradou quase ninguém dos quase 50.000 bangers que estavam morrendo debaixo
daquele sol lascado que também fez penar King Diamond que entraria no palco por
volta das 14hs todo aparatado e maquiado com o MERCYFUL FATE, vê se pode, deu
um puta show começando com ‘Evil’ e terminando o curto set com ‘Come to the
Sabbath’ pra voltar logo em seguida com
a KING DIAMOND BAND, foi só o tempo de trocar a já derretida e borrada
maquiagem que escorria devido ao calor tropical, outro puta show se seguiu com
mais cinco hinos, de ‘Welcome Home’ à ‘Abigail’, deixando todos de cara com as
performances seguidas e com os instrumentistas que o acompanharam nessa jornada
dupla, e a mídia só se preocupou em noticiar o fato dele usar um fêmur humano
como pedestal de microfone, veja tudo no santo (ou profano) Youtube em https://www.youtube.com/watch?v=jhJ2bgViAwY
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KING DIAMOND/ MERCYFUL FATE reinando sob o sol dos trópicos. |
Uma das bandas mais esperadas dessa edição
era a alemã HELLOWEEN, veterana na cena, tinha um fã clube gigante no Brasil e
que marcou presença em sua totalidade com uma bandeira imensa da famosa
‘abobrinha’ (a vantagem de se estar na arquibancada era justamente essa, se via
tudo lá de cima). O HELLOWEEN à época excursionava abrindo a tour do IRON
MAIDEN divulgando o disco “The Time of the Oath” e há quem diga que eles
pagaram muita grana pra estar nesse festival que os dimensionariam aqui no
Brasil de uma forma sem igual, começaram o show com a nova ‘We Burn’ do disco
em questão e fizeram uma típica festa Happy Happy Helloween por aqui, a
primeira de várias que seguiram nos anos seguintes... eu fui um dos capturados
por essa banda que só conhecia de nome, o máximo que eu tinha ouvido deles foi
uma fita K7 que um dos meus camaradas que me acompanharam nessa viagem me
emprestou, nessa tal fita tinha gravado o ao vivo “Live in U.K.” de 1989 ainda
com Kiske nos vocais e o que vimos aqui foi o ainda novo vocalista Andi Deris,
aliás a nova formação com os também novos Uli Kusch na bateria e Roland Grapow
na guitarra à um pouco mais de tempo ali acompanhando os fundadores Michael
Weikath e o baixista Marcus Groskopf. Realmente foi um grande show e tem uns
pedaços soltos no Youtube porcamente gravado por alguém (https://www.youtube.com/watch?v=ZqFeB_9URrI ).
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Andi Deris debutando em solo brasileiro em grande estilo |
O que viria a seguir era peso e o clima oitentista daria lugar à sonoridade
atual dos 90, os RAIMUNDOS entravam em palco com o jogo ganho, banda sensação
daquela década, a galera mais nova idolatrava e os bangers mais velhos respeitavam bem até, era bem caótico o show
deles. Uma das cenas mais marcantes pra mim foi quando a banda entrou no palco,
subiu uma cortina de fumaça naquele estádio, era marijuana demais sendo queimada ao mesmo tempo, muita mesmo vocês
não tem noção, só quem viu mesmo e ainda consegue lembrar pra te falar, outra
coisa era a barreira de contensão que separava a arquibancada do gramado, lá de
cima eu via bem, um cordão de PM’s encostados no paredão de lata do lado do
gramado e a galera lá de baixo da arquibancada se preparando pra empurrar
aquele paredão e invadir a pista livre, foi um golpe só e esmagaram os PM’s do
outro lado e da metade pra baixo, todo mundo das arquibancadas desceram quase
que rolando pra invadir o gramado, eu pensei em ir, mas eu tava beeeeem lá em
cima e não daria tempo, ia dar de cara com os gambé dando borrachada em
todo mundo, sem chance, mas que foi divertido ver o ‘rodeio de cabeludos’ dando ‘olé
nos gambé’ lá em baixo, ah isso foi um show à parte. Outra cena pitoresca
no show dos RAIMUNDOS foi a rapadura que arremessaram no palco durante o show,
de lá pelos binóculos que eu comprei lá dentro d’um ambulante eu achava que era
um tijolo de erva até que o Rodolfo no final da música agradeceu o sujeito que
mandou ‘uma rapadura voadora’ no
palco ou seja, um puta show daquela banda de moleques fumeiros, rendeu várias
histórias pra quem viveu!
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Cartaz oficial que comprei lá nas barraquinhas de merchandise oficial. Depois de muitos anos nas paredes do meu quarto, foi o que sobrou! |
Seguindo o mesmo clima 90’s veio o BIOHAZARD
com sua sonoridade atual e mega-pesada vieram com a faca nos dentes, mas eu não
tenho a dizer sobre esse show à não ser que saí de role pois não era o tipo de
som que eu ouvia na época (toma de brinde https://www.youtube.com/watch?v=tc6gV2Ep40U ), fui comprar um merchandising
oficial, sim, peguei um cartaz e uma peita da atual tour do MAIDEN pois um
camarada tinha pego uma do festival e eu não queria andar por lá com ele feito
um par de vasos, era a turnê do “X Factor” então a peita era bem legal com o
Eddie sendo torrado numa cadeira elétrica e os dizerem “Eu fui fritado na X Fac’n’tour”.
Também aproveitei pra ir comprar uma água, mas à essas horas já de noite não
existia dentro de estádio nada pra beber, a cerveja e o refrigerante tinham
acabado faziam horas e água também, estavam tomando das torneiras do banheiro
devido ao calor insuportável, algumas pessoas estavam dando dinheiro pra um
vendedor ambulante de fora do estádio pela janela do banheiro masculino e ele
passava por lá as garrafas d’água, os hot dogs eram pão seco com salsicha dura,
e olhe lá, total descaso dessa parte.
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Faixa de cabeça (muito usada nos anos 90) do festival. |
Eis que com o final do BIOHAZARD vi ‘um cara lisa’ de cabelo cumprido no
telão e pensei que o show do SKID ROW iria começar quando de repente a
barulheira começou, ERA O LEMMY PORRA! Mas como, de cara limpa, cadê o bigodão?
Pois é ele tinha rapado tudo e tava começando naquele minuto o show do
MOTÖRHEAD, corre pro lugar e borá bater cabeça como se não houvesse amanhã!
Descrever o que Lemmy, Phill Campbell e Mikkey Dee são capazes de fazer é
bobagem, todos sabemos, clássico atrás de clássico e uns sons do recente disco
de 95 “Sacrifice” se sucederam com grande desenvoltura e atenção de todos
presentes que usaram o show seguinte pra descansar ou se livrar de tudo que
tinham nas mãos, sim estou falando do SKID ROW que foi o co-headliner desse festival e durou menos do que o esperado afinal,
apesar de um show enérgico e pesado, a banda era hostilizada ao extremo por
estar entre dois peso-pesados do Heavy mundial no Brasil e o show ficou marcado
como o último da formação clássica do SKID ROW, que demitiu Sebastian Bach no
backstage daquele festival após o fiasco que foi a aceitação deles em palco,
jogaram tudo que foi lixo na banda e o vocalista foi chamado de BICHA em coro
do público que estava ali sedento por IRON MAIDEN, uma pena, pois, repito, foi
um puta show enérgico, sem frescuras, enfim, Brasil desde sempre com seus
machismos acima de tudo.(Veja mais no famoso Youtube: https://www.youtube.com/watch?v=Wkim5SFJYHU )
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Imagem aérea do começo da festa (imagem meramente ilustrativa da internet) |
Era madrugada e a galera morta, esgotada,
cansada, mas era hora do IRON MAIDEN entrar em palco pra apresentar seu novo
vocalista, e começaram com a nova ‘Man on the Edge’ que estralava nas rádios
país afora, sim, tocavam uns sons pesados nas FM’s da época. Em ‘Heaven can
Wait’, estranhamos a voz do cara? Claro, apesar de já conhecermos o disco “X
Factor” e tals, a voz dele cantando e desafinando os clássicos foi bisonho,
mas, quando nos dávamos conta de que quem estava ali de camisa da seleção
brasileira empunhando o baixo e pé no retorno era o boss Stevão e que aquela banda era O IRON MAIDEN pensávamos “...foda-se se é a
Maria Bethânia no vocal, esse é o MAIDEN!” Com alguns pares de
clássicos intercalados por canções novas e um gás daqueles o IRON MAIDEN fechou
alta madrugada aquela terceira edição do festival “Phillips Monsters of Rock”
que não aconteceria no ano seguinte para nosso desespero e só voltaria em 1998
para sua última edição pelos próximos 15 anos até ressurgir no novo milênio em
2013, mas isso é papo pra daqui uns anos...
Ah o link
pra você assistir o MAIDEN é esse aqui https://www.youtube.com/watch?v=jqLW5xZ72hw
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A tal peita oficial da turnê do MAIDEN |
(OS: A
ausência de fotos dos shows nessa resenha é simples e direta, naqueles anos os smart-phones ainda não tinham sido
inventados e nem celular a gente tinha bem dizendo e entrar em um show com
máquina fotográfica escondida era uma tarefa árdua demais, além do quê gente
nem queria tal responsabilidade, só queríamos mesmo era bater cabeça, ver as
gatas e curtir a festa, bem diferente de hoje com tantos cinegrafistas de fim
de semana nos atrapalhando com seus aparelhos mega-caros empunhados na nossa
frente. As poucas fotos que ilustram aqui são do meu acervo pessoal e as ao vivo
são de vídeos do Youtube mesmo rs....)
Que lembrança foda, valeu pelos videos...só havia conseguido os videos do King Diamond e do Mercy, agora baixei todos. Faltou citar ai aquela mina de Brasilia que passou pela revista da entrada com alguns produtos ilícitos por algum lugar pouco ortodoxo...lembra...kkk
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